Riefenstahl: O Documentário Que Reabre o Debate Sobre a Cineasta de Hitler

Um olhar sobre a artista e o peso da propaganda

Estreado nos EUA, Riefenstahl, novo documentário de Andres Veiel com produção de Sandra Maischberger, mergulha no espólio pessoal da realizadora alemã que revolucionou a linguagem cinematográfica — mas ao serviço do nazismo.

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Responsável por filmes como Triumph of the Will (1935) e Olympia (1938), Leni Riefenstahl foi pioneira na forma como filmava multidões, desportistas e eventos de massas, mas a sua proximidade a Hitler e o papel central na propaganda do Terceiro Reich tornaram-na uma figura maldita da História do cinema.

Acesso ao arquivo secreto

Depois da morte do marido de Riefenstahl, em 2016, Maischberger conseguiu acesso ao arquivo da cineasta, guardado pela Fundação do Património Cultural Prussiano. Foram 700 caixas com fotografias, documentos, gravações e até rascunhos não editados da sua autobiografia. Esse material permitiu a Veiel construir um retrato mais completo da artista, revelando contradições e detalhes até agora pouco conhecidos, como a relação com um pai autoritário e registos fotográficos de encontros pessoais com Hitler e Goebbels.

“Quero compreender, mas não exonerar”, sublinha Veiel, defendendo que o filme distingue claramente a análise da cumplicidade.

Entre a inovação e a responsabilidade

O documentário mostra como Riefenstahl se deixou seduzir por Hitler desde 1932, ano em que afirmou sentir-se “capturada por uma força magnética” após ouvir um discurso do ditador. O resultado foi Triumph of the Will, obra que cristalizou a imagem mítica do Führer, filmado como uma figura quase divina a descer dos céus.

Embora nunca tenha sido membro oficial do partido nazi, Riefenstahl usou prisioneiros de etnia cigana durante as filmagens de Tiefland (anos 40), que mais tarde seriam deportados para Auschwitz. A realizadora negou sempre ter conhecimento do destino dessas pessoas, insistindo em apresentar-se como “apenas uma artista”.

Uma figura controversa e atual

Após a guerra, Riefenstahl sentiu-se perseguida, sobretudo quando comparada a realizadores como Veit Harlan, que colaborou com o regime e conseguiu manter uma carreira no pós-guerra. Já ela só lançou dois filmes depois de 1945: Tiefland (estreado em 1954) e Impressions Under Water (2002).

Para Veiel e Maischberger, revisitar a sua obra é essencial no contexto atual de ascensão do populismo de extrema-direita. “Olhar para Leni Riefenstahl é sempre olhar para nós próprios”, afirma Maischberger.

Entre a arte e o perigo da sedução

Riefenstahl questiona até que ponto a inovação estética pode ser desligada da ideologia que serve. Como nota Veiel, “há uma diferença entre compreender e desculpar. E não há desculpa possível para a sua responsabilidade e culpa”.

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O resultado é um documentário que não procura limpar a imagem da realizadora, mas sim confrontar os limites entre arte, propaganda e responsabilidade histórica.