Bollywood em choque: a Inteligência Artificial já está a reescrever finais e a criar filmes inteiros

A indústria cinematográfica mais produtiva do mundo está a viver um momento de viragem. Bollywood, conhecida pelos seus épicos repletos de música, dança e equipas de produção gigantescas, treme agora perante uma nova força criativa — ou destrutiva, dependendo do ponto de vista: a Inteligência Artificial.

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O alerta soou quando os produtores decidiram relançar Raanjhanaa (2013) com um final alternativo gerado por IA. Onde antes havia tragédia, com a morte do protagonista, surgiu de repente um desfecho esperançoso, com os olhos do herói a abrirem-se num último instante. A mudança provocou indignação: o realizador Aanand L. Rai considerou que se tinha “violado a integridade da narrativa”, enquanto a estrela Dhanush descreveu o novo final como um ataque à própria alma do filme.

Se este episódio parecia já suficiente para acender o debate, poucos dias depois surgiu outro anúncio ainda mais ousado: Chiranjeevi Hanuman – The Eternal, o primeiro épico indiano inteiramente gerado por IA, previsto para 2026. O projeto promete unir a mitologia hindu às mais recentes tecnologias, mas também levantou receios. “E assim começa”, comentou o cineasta Vikramaditya Motwane, temendo o desaparecimento de argumentistas e realizadores de carne e osso.

Entre o entusiasmo tecnológico e o medo da obliteração artística, Bollywood encontra-se dividida. Para alguns produtores, a IA é um disruptor capaz de reduzir custos e substituir equipas numerosas, democratizando o acesso à criação de imagens de grande escala. Mas para muitos realizadores, o risco está em matar a imprevisibilidade e a expressão humana que fazem a essência do cinema.

O veterano Shekhar Kapur, realizador de Elizabeth (1998), recusa o alarmismo. Para ele, “as melhores histórias são imprevisíveis, e a IA não consegue lidar com a imprevisibilidade”. Mais: acredita que a tecnologia pode abrir caminho a novos talentos que, sem meios para estudar cinema, finalmente poderão contar histórias através destas ferramentas. Já o realizador Shakun Batra, responsável por dramas como Kapoor & Sons, defende que o equilíbrio será sempre a chave: a IA deve complementar e não substituir a criatividade humana.

O público, porém, parece ter dado a primeira resposta. Face à polémica em torno de Raanjhanaa, os fãs mostraram fidelidade à versão original e rejeitaram a manipulação feita pela IA. Talvez esteja aí a prova de fogo: não bastará criar mundos perfeitos em computador se as emoções humanas, transmitidas no grande ecrã, não forem igualmente autênticas.

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No fundo, a questão permanece em aberto: será a IA a grande ameaça ao cinema indiano ou apenas mais uma ferramenta capaz de reinventar Bollywood? Uma coisa é certa: tal como acontece nas suas histórias mais vibrantes, também aqui o drama promete ser longo e cheio de reviravoltas