O que acontece quando se atropela um unicĂłrnio? E se esse momento surreal for o catalisador para uma comĂ©dia negra sobre ganância, sátira social e unicĂłrnios vingativos? Death of a Unicorn, novo filme da A24 realizado por Alex Scharfman, responde a esta pergunta improvável com humor ácido, crĂ­tica social e uma criatura mĂ­tica que desafia convenções.

Estreando esta sexta-feira nos EUA e no Reino Unido, o filme junta Paul Rudd e Jenna Ortega — num inesperado par pai-e-filha — numa jornada bizarra, cómica e, ao mesmo tempo, estranhamente comovente.

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O inĂ­cio de um pesadelo (mitolĂłgico)

Tudo começa com um acidente de carro. Ridley (Jenna Ortega) e o seu pai Elliot (Paul Rudd) atropelam uma criatura improvável: um unicórnio bebé. O que poderia ser uma ocorrência mágica rapidamente se transforma num dilema ético e num campo minado de interesses corporativos, quando a descoberta do animal fantástico pode representar uma oportunidade de ouro para agradar ao patrão bilionário de Elliot.

A premissa já Ă©, por si sĂł, digna de uma curta absurda ou de um conto Ă  Kurt Vonnegut — e nĂŁo por acaso, o prĂłprio Scharfman Ă© fĂŁ confesso do autor. Mas Death of a Unicorn vai muito alĂ©m do seu ponto de partida surreal, construindo um universo satĂ­rico sobre classes sociais, ganância e a obsessĂŁo contemporânea em controlar tudo, atĂ© a natureza mais pura e mitolĂłgica.

Sátira sem subtilezas, mas com propósito

Escrito por Scharfman em 2019, antes da pandemia, o argumento já mergulhava numa visão crítica da elite económica e das suas dinâmicas de poder. Mas, como o realizador reconhece, o mundo ficou ainda mais insano desde então — e, como tal, seria quase ingénuo escrever sátira subtil em 2025.

“Vivemos tempos descarados, em que o homem mais rico do mundo tem um escritório na Casa Branca. A realidade já é caricata o suficiente. Por isso, este filme tem de ser direto, e talvez até catártico”, explica Scharfman.

E Ă© isso que faz de Death of a Unicorn tĂŁo refrescante: a sua recusa em filtrar ou suavizar as suas ideias. É, como diz o prĂłprio realizador, uma comĂ©dia negra com “justiça restaurativa violenta” — onde os unicĂłrnios, criaturas tipicamente associadas Ă  inocĂŞncia e Ă  pureza, surgem como forças brutais da natureza contra um sistema que tenta aprisioná-las.

Jenna Ortega e Paul Rudd: química improvável, mas eficaz

No centro do caos, Jenna Ortega destaca-se como Ridley, a única personagem com um fio de consciência ética no meio da loucura. Ela é a âncora emocional do filme — e a voz do público — confrontada com um grupo de milionários excêntricos, vaidosos e, por vezes, absolutamente patéticos.

Paul Rudd, por sua vez, oferece uma das performances mais dúbias e divertidas da sua carreira recente: um pai que sabe que tudo à sua volta está errado, mas que continua a sorrir educadamente e a tentar agradar. Will Poulter é um destaque à parte, com uma interpretação hilariante de um “tech bro” mimado e narcisista, símbolo máximo da geração que acha que a fortuna equivale a sabedoria.

Um unicĂłrnio Ă  vista de todos

Scharfman faz questĂŁo de nĂŁo esconder o seu monstro — e ainda bem. Ao contrário de tantos filmes de terror modernos que preferem manter a criatura nas sombras, Death of a Unicorn vai a fundo na construção do seu animal mĂ­stico, combinando efeitos práticos com CGI e recorrendo atĂ© a marionetas realistas no set. O resultado Ă© uma criatura crĂ­vel, fĂ­sica e memorável.

“As pessoas querem ver. Querem uma criatura que possam estudar, admirar e até temer. Por isso, ao longo do filme vamos mostrando cada vez mais até o unicórnio estar, literalmente, a descer as escadas da mansão em plena luz do dia”, revela o realizador.

Ecos de John Carpenter e Buñuel

Cinefilamente falando, Death of a Unicorn bebe de muitas fontes: dos creature features dos anos 70 e 80, como The Thingde John Carpenter, Ă  sátira social de Buñuel (O Anjo Exterminador) e Altman (Gosford Park). Mas o que verdadeiramente distingue este filme Ă© a sua ousadia em misturar todos esses tons — horror, comĂ©dia, drama e absurdo — sem perder o equilĂ­brio narrativo.

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Com diálogos inteligentes, personagens marcantes e uma crítica mordaz ao capitalismo moderno e à exploração da natureza, o filme da A24 tem tudo para se tornar um dos títulos mais falados do ano — e, talvez, um futuro clássico de culto.

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